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Cadastre-se como clienteProfessora universitária há mais de três décadas. Mestre em Filosofia. Mestre em Direito. Doutora em Direito. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.
Presidente da ABRADE-RJ - Associação Brasileira de Direito Educacional. Consultora do IPAE - Instituto de Pesquisas e Administração Escolar.
Autora de 29 obras jurídicas e articulista dos sites JURID, Lex-Magister, Portal Investidura, COAD, Revista JURES, entre outras renomadas publicações na área juridica.
A polêmica sobre a fungibilidade recursal e o CPC/2015.
Resumo: Ainda vige acirrada polêmica acerca de fungibilidade recursa e conversibilidade recursal mesmo diante do vigente CPC, seja na caracterização dos requisitos autorizantes, seja para se identificar os limites existentes entre um e outro requisito, o que em geral, representa o insucesso da parte recorrente e a negatória do acesso à justiça e do princípio da primazia do julgamento do mérito.
Palavras-chave: Direito Processual. Fungibilidade recursal. Princípio da Primazia do Julgamento do Mérito. Conversibilidade recursal. Constituição Federal brasileira de 1988.
Résumé: Il existe toujours une polémique féroce sur la fongibilité et la convertibilité de l'appel même face à la CPP actuelle, que ce soit dans la caractérisation des exigences d'autorisation, ou pour identifier les limites existantes entre l'une et l'autre exigence, qui en général, représente la carence du requérant et déni d'accès à la justice et du principe de la primauté du jugement sur le fond.
Mots-clés: Droit procédural. Fongibilité récursive. Principe de primauté du jugement de mérite. Convertibilité récursive. Constitution fédérale brésilienne de 1988.
Os requisitos fundamentais para a fungibilidade recursal são a dúvida objetiva[1], a ausência de erro grosseiro e de má-fé o que não se mostra ser compatível com o vigente Código Processual Civil brasileiro (o de 2015[2]) pois deve-se redimensionar tais requisitos a partir do princípio da primazia de resolução do mérito[3] e do regime de invalidades e nulidades, que deve ser conjugado com os dispositivos legais que positivam a conversibilidade recursal.
É sabido que a fungibilidade recursal permite que um recurso seja admitido no lugar de outro, como se ambos os recursos fossem aptos a impugnar certo provimento judicial, sem qualquer adaptação necessário para sua apreciação.
E, a fim de não admitir uma completa subversão do sistema recursal por meio da dita fungibilidade, então, foram criados dois requisitos essenciais para sua aplicação, a saber: a dúvida objetiva ou inexistência de erro grosseiro, que atuam como duas faces da mesma moeda, e, ainda, a ausência de má-fé. Se bem, que somente o primeiro requisito, já embute o segundo.
Até hoje, tais dois requisitos são sistematicamente aplicada pela jurisprudência pátria, seja no processo civil ou mesmo no processo penal.[4] Porém, não se observou que para uma real modificação da sistemática processual brasileira ao longo do tempo, pois a fungibilidade tradicional não pode mais ser aplicável à luz do vigente CPC.
Ademais o Código Fux passou a positivar explicitamente a conversibilidade recursal, ou seja, a modificação do recurso impetrado para adequá-lo à modalidade recursal adequada e correta pelo órgão julgador, e que atua no mesmo sentido da fungibilidade, porém, com esta não se confunde, prestigiando-se notoriamente o julgamento do mérito.
Há, portanto, crassa incompatibilidade normativa de tais citados requisitos da fungibilidade recursal com o CPC vigente[5] e, que prestigia com maior ênfase a jurisprudência defensiva do que os princípios, particularmente, aqueles que tratam de invalidades e nulidades, bem como da conversão de recursos.
Pode-se até acreditar que é o princípio do acesso à justiça que melhor fundamenta a fungibilidade recursal tradicional, Pois, a admissibilidade dos recursos, tem cabimento na possibilidade de recorrer e, ainda, na eleição adequada do tipo recursal cabível para impugnar certo provimento decisório, que pode variar, conforme a natureza da decisão impugnada (agravo/apelação), com o órgão prolator (agravo de instrumento/ agravo interno), com o fundamento recursal (Embargos de declaração/ recurso especial e extraordinário). Trata-se, assim, de opções legislativas referentes a forma recursal adequada.
Nosso sistema recursal é bastante complexo, tanto que indica nove espécies recursais listadas apenas no Código Fux, além de sucedâneos recursais, tais como a reclamação, as demandas autônomas de impugnação tais como o mandado de segurança e a ação rescisória.
Conclui-se não ser uma tarefa fácil compreender razoavelmente tais mecanismos, especialmente considerando as leis especiais. E, foi com base nessa complexidade que desde do CPC de 1929, que o ordenamento processual pátrio previu a fungibilidade recursal, de forma expressa, e ressalvando apenas as hipóteses de má-fé, de erro grosseiro e que não rendeu, infelizmente, muitos frutos na prática.
Já no CPC de 1973[6], o Código Buzaid, não fora reprisada tal norma, diante a suposta simplificação do regime recursal adotada, e com a redução crucial da chamada dúvida objetiva entre as hipóteses de cabimento. Entretanto, a doutrina e a jurisprudência[7] continuaram aplicando o instituto, sem qualquer alteração nos requisitos então previstos originalmente no artigo 810 do CPC de 1939[8].
Ademais, deu-se crescente confusão entre o conceito de fungibilidade recursal e o de conversibilidade recursal, o que veio enfraquecer o potencial da primeira, uma vez que se passou a exigir a interposição do recurso dentro do prazo daquele que seria considerado o correto, para se possibilitar a dita conversão. Quase um dom premonitório e metafísico.
Afora isso, não se pode olvidar que apesar de existir a fungibilidade sempre exaltada pela doutrina tradicional, jamais se conseguiu se livrar da zona cinzenta entre qual seria o recurso cabível. De sorte que mesmo na conversibilidade recursal, jamais se dispensará o recurso escorreito.
E, no Código Buzaid em comparação ao Código Fux que deixou de prever expressamente a fungibilidade recursal, porém, não impediu que a doutrina sustentasse que o princípio da fungibilidade recursal seja compatível com o Codex e alcançar todos os recursos, sendo até aplicável de ofício.
Apesar de ser prática louvável, não está alinhada com a lógica que permeia todo o Código Fux, porque não se conseguiu desvincular da dúvida objetiva e do erro grosseiro[9]. Destaque-se ainda que o progresso legislativo sobre a matéria se refere apenas à unificação do prazo recursal, previsto no artigo 1.003, §5º CPC/2015 o que veio a reduzir os freios da fungibilidade, que a rigor deveria se referir à conversibilidade.
O Princípio da Primazia da Resolução do Mérito estampado no artigo 4 CPC seria também extraído de diversos dispositivos legais que permitem até a desconsideração de vícios formais, como prevê o artigo 282, §4º do CPC, bem como sua correção, no artigo 932, parágrafo único do CPC.
A função desse princípio é determinar que o julgador priorize a resolução do mérito sempre que for possível, se valendo, para tanto de seus poderes de saneamento de vícios formais e processuais. Porque isso tem como objetivo primaz a resolução do mérito, cabendo ao Estado-juiz e às partes cooperarem não apenas para um diálogo para se galgar um resultado, mas também para que uma decisão de mérito seja alcançada como sendo expressão do que é estabelecido no artigo 6º do CPC, aportando-se na decisão de mérito justa e efetiva.
O referido princípio e sua aplicação deve ser restrito apenas às normas que explicitamente consagram a possibilidade de correção ou de desconsideração de vícios formais, sendo aplicável a todo e qualquer dispositivo que trate do tema devendo ser mesmo interpretado visando à resolução do mérito, especialmente, nas hipóteses em que uma literal interpretação conduza a uma resultado antagônico, ou seja, uma decisão terminativa.
Há muito tempo a doutrina pátria defende que as formas não podem prevalecer sobre o conteúdo dos atos processuais e que o processo não pode ser meramente formalista, devendo assim conciliar-se com a segurança jurídica garantida pela forma com o objetivo pretendido pelo ato.
E, assim, o CPC de 1939 já tinha diversos dispositivos positivados nesse sentido, como no seu capítulo de nulidades do artigo 273 até 279 que prevê os vícios de forma (invalidades) possam ser relevados em diversas situações, sem a cominação de nulidades processuais.
E, quanto ao Código Fux, a primeira destas foi trazida pelo artigo 277 do CPC, trata da regra da instrumentalidade das formas, segundo a qual não se pronuncia a nulidade se o ato alcançar sua finalidade precípua. E, nesse sentido, é possível verificar que existem muitos vícios graves, tal como, por exemplo, a invalidade relativa à citação, constante no artigo 280 CPC que podem ser relevados, caso o objetivo pretendido pelo ato tenha sido alcançado por outro meio.
Porém, essa finalidade, isto é, a instrumentalidade das formas não pode ser analisada isoladamente, devendo ser conjugada com as demais normas sobre as nulidades.
Curial destacar que o erro de forma do processo somente acarreta a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devem ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem todas as prescrições legais.
Além de que ao se verificar a irregularidade da qual resulta prejuízo para alguma das partes ou se é possível decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade.
E, assim, há inquestionável e inexorável tendência do processo civil brasileiro relevar os vícios de forma dos atos processuais, havendo quem cogite em validade prima facie dos atos, como verdadeira preferência normativa.
E, cabe ainda analisar como a primazia de resolução de mérito e da primazia de validade dos atos processuais praticados com forma diversa da estabelecida e que conduzem naturalmente a uma releitura sobre a fungibilidade recursal.
Nessa releitura, observa-se o fim da dúvida objetiva e do erro grosseiro e, ainda que o CPC de 2015[10] possui algumas situações de conversão recursal, tal como o dos embargos de declaração[11] em agravo interno, e recurso extraordinário e especial[12].
Apesar das divergências entre os recursos retrocitados, não paira dúvida de que ambos se relacionam à primazia de resolução do mérito e visam justamente à superação de óbices formalistas ao conhecimento recursal, e se refere a uma opção por um ou outro recurso refere-se à forma utilizada.
A opção inadequada de forma referente à interposição de recursa deve ser analisada sob a égide do atual regime de nulidades, considerando-se: 1. o alcance do fim pretendido; 2. a ausência de prejuízos; 3. a possibilidade de julgamento favorável ao recorrido do mérito recursal, que já se beneficiaria pelo não conhecimento do recurso.
Assim, a fungibilidade recursal deverá caminhar junto com a análise das invalidades e nulidades processuais. E, com foco no fim pretendido, verificando-se se o recurso usado permitirá que se atinja o mesmo resultado do recurso percebido como correto, na prática, pelo órgão recursal competente para o julgamento.
É o caso por exemplo, a apelação[13] e o agravo de instrumento se prestam à mesma finalidade: anulação ou reforma da decisão recorrida, e por outro viés, recursos de fundamentação vinculada (especial e extraordinária) não possibilitariam que se ignorasse o erro de forma.
No que tange à ausência de prejuízos, trata-se de requisito ligado intimamente ao déficit de contraditório. Isto é, a opção pelo recurso inadequado não pode gerar ara o recorrido uma redução no potencial de influência sobre o resultado.
Assim, não haveria qualquer prejuízo caso se valesse do agravo de instrumento no lugar do agravo interno contra a decisão interlocutória de relator (equívoco facilmente concebido como grosseiro numa visão tradicional), pois ambos seria levados ao mesmo órgão competente, no mesmo prazo e com igual oportunidade de discussão da decisão recorrida.
Há situações, no entanto, em que as matérias suscitadas e a extensão do efeito devolutivo são diversas, o que pode ter reflexos no contraditório e, até mesmo, na ampla defesa com a possibilidade de produção de novas provas.
Da mesma forma, há outros elementos que podem ser analisados para se galgar à fórmula do prejuízo, como a duração razoável do processo, com destaque o fato de que, em alguns casos, a interposição errônea que pode até mesmo acelerar o procedimento, bastando observar que o agravo de instrumento é imediatamente dirigido ao juízo ad quem, sem a submissão ao juízo a quo, momento de grande atraso para o procedimento processual, enquanto que a opção inversa, poderá ser suficiente para impedir a fungibilidade recursal a partir da lógica do prejuízo.
A partir da lógica das invalidades processuais, in lato sensu, da instrumentalidade processual, não é possível nem plausível o sacrifício do contraditório para se privilegiar a liberdade de formas, o que impedirá a fungibilidade recursal.
E, como derradeiro requisito, sendo possível decidir o mérito recursal a favor do recorrido, o artigo 282, §2ºdo CPC estabelece que as invalidades devem ser relevadas, de modo que não se pronunciará a nulidade, no caso dos recursos, não se deixará de conhecê-los.
Aliás, para Alexandre Freitas Câmara[14] tendo em vista que a teoria da causa madura é norma excepcional, não pode ser aplicada irrestritamente ao agravo de instrumento, mas assegura apenas àqueles que versem sobre mérito do processo. Caso se adote a ideia de Fredie Didier Jr., e de Leonardo Carneiro Cunha, de utilização da causa madura a qualquer hipótese de agravo. Não há que se cogitar em qualquer prejuízo referente ao efeito devolutivo.
De fato, existem divergência acerca da possibilidade de produção de provas novas em grau recursal, no agravo de instrumento, em razão da supressão de instância: a favor desse entendimento. É cabível a prova técnica simplificada em agravo de instrumento.
Cabe destacar ainda que a aplicação de tais premissas estão alinhadas com a primazia de resolução do mérito, vez que não há qualquer sentido em privilegiar a inadmissibilidade recursal, quando existe um CPC que estabeleceu de forma pioneira, um princípio que visa privilegiar a análise do mérito.
E, nesses parâmetros torna-se quase irrelevante a análise da má-fé na aplicação da fungibilidade, pois ela nos diz pouco acerca do aproveitamento do recurso equivocadamente interposto, já que, mesmo que a escolha tenha sido feita propositalmente com intuito incompatível com a boa-fé processual, é possível que não ocorra qualquer prejuízo às partes.
Não se pode laborar com a fungibilidade recursal da mesma forma que esta surgiu em 1939, sob pena de reconhecermos que oitenta anos de desenvolvimento da dogmática processual, pautada a partir da instrumentalidade das formas e, ainda, a criação de novos princípios, além o da primazia da resolução do mérito, quando pouco se cogitava sobre a economia e da eficiência processual em 1939).
Conclui-se que devemos alterar os paradigmas[15] de análise da fungibilidade recursal, para que se abandone os revogados pressupostos do artigo 810 do CPC/1939, erro grosseiro e má-fé, obsoletos e contrários aos princípios do CPC e, se utilizem os parâmetros supracitados previstos no atual CPC e que sejam compatíveis com os princípios regentes da ordem jurídica processual brasileira.
Na verdade, o próprio CPC traz dispositivos que priorizam a conversão do recurso equivocado no recurso escorreito, em hipóteses de fundamentações vinculadas, em que seria praticamente inviável e impossível a fungibilidade entre ambos, o que mostra sua preferência pela conversão à inadmissibilidade, demonstrando sua compatibilidade com a primazia de resolução do mérito.
Tais dispositivos nos revelam muito mais do que aparentam e devemos interpretá-los de forma a extrair um autêntico princípio da conversão, de aplicação expansiva e, não restrita àqueles recursos específicos, quando não for possível a fungibilidade recursal, devemos no valer da conversibilidade recursal, e não somente, nas hipóteses expressamente previstas (agravo interno e embargos de declaração, recursos especial e extraordinário).
Frise-se que não há qualquer referência nesses dispositivos a erro grosseiro, a dúvida objetiva ou a má-fé, o que indica sua desnecessidade para que os recursos sejam conhecidos independentemente da forma escolhida, sem que enfrentemos qualquer congestionamento processual.
De forma supletiva ou complementar à fungibilidade recursal, impõe-se reconhecer que a conversão do recurso equivocado no recurso entendido como escorreito se mostra preferível à sua inadmissibilidade, de forma consentânea com a primazia de resolução do mérito, além de servir de reforço ao abandono dos requisitos tradicionais da fungibilidade recursal, que já não estão previstos nos artigos 1.024, §3º, 1.032 e 1.033 do CPC.
Não é mais possível tratar a fungibilidade recursal da mesma forma conforme quando surgiu no ordenamento brasileiro, pelo CPC de 1939, pois se operou uma evolução da dogmática processual, que não mais prioriza as formas ao conteúdo e à finalidade pretendida, sob pena de priorizarmos a jurisprudência[16] defensiva que se formou no Judiciário pátrio.
E, o regime de invalidades, temos a consagração do princípio da primazia de resolução do mérito que vem no mesmo sentido, a fim de afastar qualquer tentativa de manutenção da prática de jurisprudência[17] defensiva. Assim demonstra-se que os tradicionais requisitos da fungibilidade recursal, tal como a ausência de erro grosseiro, ou dúvida objetiva e de má-fé, não são mais compatíveis com a atual principiologia e sistemática de invalidades presente no CPC de 2015 pois privilegiam a forma do recurso cabível ao conteúdo e à finalidade[18].
Sugere-se assim, o uso dos parâmetros do regime de invalidades e nulidades do próprio CPC, que se mostra ser mais atual e consentâneo com o vigente regime processual levando em conta o fim pretendido e alcançado; a ausência de prejuízos; a possibilidade de julgamento favorável ao recorrido do mérito recursal, que já se beneficiaria pelo não conhecimento do recurso.
E, também porque as previsões do Código Fux de conversão recursal também reforçam o abandono das premissas tradicionais e vetustas de fungibilidade recursal e, criam outro princípio[19], o da conversibilidade recursal, que deve ser aplicado de forma complementar, evitando-se, ao máximo e a inadmissibilidade.
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[1][1] A doutrina, grosso modo, para demonstrar que a dúvida é “objetiva”– como demonstrado, consideramos que esta deva ser exterior à pretensão recursal do recorrente —, reputa necessária ampla divergência na doutrina e jurisprudência. Esta assertiva pode ser colhida na conclusão n. 55, do 6.º Encontro dos antigos Tribunais de Alçada: “Admite-se a fungibilidade dos recursos desde que inocorrente o erro grosseiro; inexiste este quando há acentuada divergência doutrinário-jurisprudencial sobre o que seria o recurso próprio.”
[2] Fórum Permanente de Processualistas Civis. Enunciado 104: O princípio da fungibilidade recursal é compatível com o NCPC e alcança todos os recursos, sendo aplicável de ofício.
[3] Julgados do TJDFT. “3. Destarte, devem reger o processo os princípios da instrumentalidade das formas, do máximo aproveitamento dos atos processuais, da economia e da primazia do julgamento de mérito. 4. Quanto a este último, ou seja, ao princípio da primazia no julgamento de mérito, o rito processual foi projetado pelo legislador para resultar em julgamento definitivo de mérito. Por tal razão, essa espécie de julgamento é considerada o fim normal dessa espécie de processo ou fase procedimental, e deve ser prestigiado.”
Acórdão 1154762, 07076661220188070001, Relator: JOÃO EGMONT, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 27/02/2019, publicado no DJe: 08/03/2019. 1. A nova sistemática processual inaugurada com o advento do CPC/2015 privilegia expressamente o princípio da primazia no julgamento de mérito. Logo, a extinção do processo sem resolução do mérito é medida anômala que não se corrobora a efetividade da tutela jurisdicional (art. 4º, CPC/2015).” Acórdão 1151477, 07033062220188070005, Relator: SILVA LEMOS, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 13/02/2019, publicado no DJe: 11/03/2019.
[4] Pode ser conhecida como recurso em sentido estrito a apelação erroneamente interposta contra decisão que julga inepta a denúncia, com a condição de que, constatada a ausência de má-fé, tenha sido observado o prazo legal para a interposição daquele recurso e desde que o erro não tenha gerado prejuízo à parte recorrida no que tange ao processamento do recurso. Isso porque, nessa situação, tem aplicabilidade o princípio da fungibilidade recursal. De fato, o art. 581, I, do CPP dispõe que caberá recurso em sentido estrito da decisão, despacho ou sentença que não receber a denúncia ou a queixa. Todavia, o mero equívoco na indicação do meio de impugnação escolhido para atacar a decisão não deve implicar necessariamente a inadmissibilidade do recurso, conforme determina o art. 579 do CPP, segundo o qual “Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro. Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso interposto pela parte, mandará processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível”. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.244.829-RS, Quinta Turma, DJe 27/4/2012; e HC 117.118-MG, Sexta Turma, DJe 3/8/2009. REsp 1.182.251-MT, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 5/6/2014.
[5] Com a entrada em vigor do CPC/2015, surgiu uma dúvida quanto à natureza jurídica da decisão do §5º do art. 550 do referido diploma processual civilista. Em outras palavras, havia discordância se a referida decisão tinha caráter interlocutório ou terminativo. A princípio, parece-nos que ambas as teses têm argumentos plausíveis. No caso de procedência, o instrumento decisório analisado apresenta caráter interlocutório, pois decide apenas parte do mérito, devendo ser apurados possíveis saldos mercantis na segunda fase, por conseguinte, o recurso cabível para enfrentar o decisum a quo seria o agravo de instrumento. Ao passo que, caso a decisão da primeira fase da ação de exigir contas seja denegatória ao pleito autoral, toma-se a face terminativa e, portanto, aparenta ser uma sentença da qual se deve recorrer através de recurso de apelação. Por essa característica sui generis, a decisão em voga gerou a divergência evidenciada pelo confronto dos arestos supra colacionados.
[6] O Código de 1973 não previa expressamente a fungibilidade dos recursos. Entretanto, essa circunstância não impedia a utilização do princípio, que era deduzido do sistema e aplicado por meio do princípio da instrumentalidade das formas ao sistema recursal. Sendo certo é que, com a racionalização da classificação dos atos decisórios pelo art. 162 do CPC/1973, seguida de uma previsão de recursos que conecta com tal classificação (CPC/1973, arts. 513 e 522), muito se reduziu a possibilidade de dúvidas sérias em torno do cabimento de um ou outro recurso, ao longo da marcha processual. A experiência do foro, todavia, demonstrou que, às vezes por deficiência terminológica do próprio Código, e outras vezes por divergências doutrinárias ou jurisprudenciais, ainda ocorriam situações de dúvida na definição do recurso cabível, o que justificava a invocação do princípio da fungibilidade.
[7] Fungibilidade - admissibilidade recursal. “1. A despeito do flagrante inadequação do nomen iures atribuído pelo autor ao recurso adotado para impugnar a Sentença, assinalado como Recurso Inominado, não há óbice à flexibilização do pressuposto de admissibilidade recursal do cabimento, em razão do princípio da fungibilidade e da primazia do julgamento do mérito, quando protocolado dentro do prazo legal fixado pelo Código de Processo Civil para interposição do Recurso de Apelação.” Acórdão 1092429, 07061469720178070018, Relator: EUSTÁQUIO DE CASTRO, 8ª Turma Cível, Data de Julgamento: 26/04/2018, publicado no DPJe: 28/04/2018.
[8] O vetusto CPC de 1939 a fim de evitar os inconvenientes da interposição recursal errônea, decorrente de seu tumultuado sistema recursal, adotava, de forma expressa o princípio da fungibilidade. Visto que não existia a dita simplificação tão apregoada pelo CPC de 1973 que por exemplo, estabelecia que contra toda sentença definitiva ou terminativa caberá apelação, uma vez que, no então vigente CPC de 1939, na primeira hipótese, seria cabível a apelação (artigo 820) e, na segunda hipótese, o agravo de petição (artigo 846 CPC).
[9] TST não aplica princípio da fungibilidade quando há erro grosseiro na escolha do recurso. O princípio da fungibilidade – que prevê a aceitação de um recurso quando o correto seria outro, desde que haja dúvida na doutrina ou jurisprudência sobre qual seria o correto a ser utilizado – não é aplicável quando houver erro grosseiro na escolha do recurso. Com base nesse entendimento, a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho,) negou provimento a agravo apresentado por uma trabalhadora. A empregada do Banco Santander interpôs agravo de instrumento contra decisão monocrática que negou seguimento a seu recurso ordinário em ação rescisória, em processo no qual pleiteou do banco o pagamento de horas extras além da sexta hora diária e outras verbas trabalhistas. Para contestar a negativa de seguimento, o recurso adequado seria o agravo previsto no artigo 557, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (CPC). No entanto, a empregada interpôs equivocadamente o agravo de instrumento previsto no artigo 897, alínea "b", da CLT, incabível nesse caso. Ao analisar o agravo de instrumento, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) não o admitiu por enxergar a ocorrência de erro grosseiro, na medida em que o recurso correto está expressamente previsto em lei, o que afasta qualquer dúvida razoável acerca do instrumento cabível. A trabalhadora recorreu da decisão ao TST pleiteando que seu agravo fosse acolhido com base no Princípio da Fungibilidade. A SDI-2, no entanto, negou provimento ao apelo porque a Corte já tem entendimento firmado no sentido de que a aplicação da fungibilidade recursal é condicionada à inexistência de erro grosseiro. Processo: AgR-RO-9906-86.2010.5.02.0000;
[10] A edição do novo CPC em 2015 mostra a constitucionalização do Direito Processual Civil no enunciado do art. 1 º do CPC, no qual constata-se que a norma jurídica deve ser construída e interpretada de acordo com a Constituição Federal. Nesse viés, observa-se que há uma integração do texto constitucional de normas processuais, afirmando princípios e garantias fundamentais da Carta de 1988.
[11] Uma situação recorrente deste uso era a hipótese de conversão do julgamento dos Embargos de Declaração (ED) que atacassem decisões monocráticas dos relatores nos tribunais em Agravo Interno (AI). O Superior Tribunal de Justiça (STJ), nestas hipóteses, embasado no princípio da fungibilidade (e da economia processual), aceita, com recorrência, os embargos declaratórios com efeito infringente como recurso de agravo interno.
O problema da simples conversão é evidente, pois o objeto dos EDs é o de se buscar esclarecimento ou integração de uma decisão eivada dos vícios de obscuridade, contradição ou omissão (ou mesmo a correção de erro material — vide artigo 1.022, CPC 2015) e o objeto do AI já é o de se buscar no colegiado a reforma da decisão impugnada.
[12]Evidencia-se que para o CPC/2015, no campo dos recursos excepcionais, ser irrelevante o equívoco da parte em usar o especial em lugar do extraordinário e vice e versa, pois sempre será possível a conversão do inadequado no adequado. Se tal é autorizado perante esses recursos, nada impedirá que a fungibilidade seja também observada em relação aos recursos ordinários. Por último, deve-se lembrar que a adoção de um recurso pelo outro, quando preservados os requisitos de conteúdo daquele que seria o correto, e não constatados a má-fé nem o erro grosseiro, resolve-se em erro de forma; e, para o sistema de nosso Código, não se anula, e, sim, adapta-se à forma devida o ato processual praticado sem sua estrita observância (CPC/2015, arts. 277 e 283, parágrafo único).” (In: THEODORO Jr., Humberto. Curso de Direito Processual Civil - Vol. 3. (54ª edição) Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 814).
[13] Dados do processo interpretado já formatados para citação: (TJSP; Apelação Cível 0108273-29.2007.8.26.0002; Relator (a): Sergio Gomes; Órgão Julgador: 37ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II – Santo Amaro – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/08/2022; Data de Registro: 02/09/2022)
Ementa do processo interpretado:
APELAÇÃO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO DE EXTINÇÃO PARCIAL. ADMISSIBILIDADE RECURSAL – Recurso de apelação interposto contra ato decisório de natureza jurídica interlocutória – Decisão que não extinguiu integralmente a execução – Extinção com relação a algum dos executados e determinação de prosseguimento do procedimento em face de outros – Princípio da fungibilidade – Inaplicabilidade – Erro grosseiro – Precedentes deste Tribunal. SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO CONHECIDO.
[14] Vale destacar que do art. 4º do CPC (e de uma grande série de outros dispositivos, como o art. 317 e o art. 488, entre muitos outros exemplos que poderiam ser indicados) se extrai um outro princípio – infraconstitucional – fundamental para o sistema processual brasileiro: o princípio da primazia da resolução do mérito. É que, como se vê pela leitura do art. 4º, 'as partes têm o direito de obter [a] solução integral do mérito'. O processo é um método de resolução do caso concreto, e não um mecanismo destinado a impedir que o caso concreto seja solucionado. Assim, deve-se privilegiar, sempre, a resolução do mérito da causa. Extinguir o processo sem resolução do mérito (assim como decretar a nulidade de um ato processual ou não conhecer de um recurso) é algo que só pode ser admitido quando se estiver diante de vício que não se consiga sanar, ou por ser por natureza insanável, ou por se ter aberto a oportunidade para que o mesmo fosse sanado e isso não tenha acontecido. Deve haver, então, sempre que possível, a realização de um esforço para que sejam superados os obstáculos e se desenvolva atividade tendente a permitir a resolução do mérito da causa. É por isso, por exemplo, que se estabelece que no caso de se interpor recurso sem comprovação de recolhimento das custas devidas deve haver a intimação para efetivar o depósito (em dobro, para que não se estimule a prática apenas como mecanismo protelatório) do valor das custas, viabilizando-se deste modo o exame do mérito (art. 1.007, § 4º), ou se afirma que 'desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485'. Há, pois, no moderno direito processual civil brasileiro, um princípio da primazia da resolução do mérito, o qual, espera-se, seja capaz de produzir resultados bastante positivos no funcionamento do sistema de prestação de justiça civil.” (In: CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro, 5ª edição, São Paulo: Atlas, 2019, p. 7).
[15] Outro caso que demonstra o dissídio e evidencia clara ameaça à segurança jurídica é o caso de alteração do entendimento da mesma Câmara – inclusive, com o mesmo relator nos dois julgados – do TJDFT: clarividente posição dos doutrinadores Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero acerca do tema33: [...] O Código de 2015, porém, optou por seguir outro caminho. Expressamente afirma que o ato do juiz que julga a primeira etapa do processo da ação de exigir contas é uma decisão, ou seja, uma decisão interlocutória (art. 550, §5º, do CPC). Parece que a opção legislativa do Código de 2015 é melhor. Em primeiro lugar, esta conclusão harmoniza-se melhor com a ideia de que o Código faz de sentença (vinculando-a ao encerramento de uma das fases, ou de conhecimento ou de satisfação, do processo). Em segundo lugar, caracterizar esse ato como decisão interlocutória faz com que o recurso designado para o atacar seja o agravo, que, por subir em instrumento próprio, e por não ser dotado de efeito suspensivo, não impede, por si só, o prosseguimento do processo para a segunda fase.
[16] Da (in) aplicação da fungibilidade aos recursos que impugnam a decisão da primeira fase das ações de exigir contas. Sobre diferentes entendimentos a respeito da aplicação ou não do princípio da fungibilidade nos casos em que se confronta a decisão da primeira fase da ação de exigir contas por uma via inadequada, conforme entendimento dos tribunais e da doutrina. Em regra, tratar-se-ão de casos levados até os Tribunais de Justiça. Logo após vez que existe divergência quanto ao recurso cabível na primeira fase do procedimento, imperioso analisar qual a natureza jurídica da decisão em foco, isto é, se interlocutória ou terminativa. Inicialmente, faz-se menção ao julgado proferido na 25ª Câmara de Direito Privado do TJSP, o qual admitiu a interposição de apelação contra a decisão da primeira fase da ação de exigir contas. Para fundamentar o decisum, o tribunal traz à tona o princípio da fungibilidade e a divergência doutrinária e jurisprudencial sobre o assunto.25 Já a 10ª Câmara Cível do TJRS entende de modo diverso a questão apreciada pelo TJSP. Segundo o Egrégio Tribunal Riograndense, a apelação é via inadequada para impugnar a decisão da primeira fase do procedimento em análise, não merecendo se quer o conhecimento de tal recurso. Desta feita, o tribunal nega tacitamente a aplicação do princípio da fungibilidade ao caso.
[17] Pode-se afirmar que o TJRJ se mostrou pioneiro ao consolidar o entendimento de que a decisão que encerra a primeira fase da ação de exigir contas é recorrível por agravo de instrumento, fundamentando o seu posicionamento, dentre outros dispositivos jurídicos, no enunciado 177 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC), o qual diz ipsis litteris: (arts. 550, § 5º e 1.015, inc. II) A decisão interlocutória que julga procedente o pedido para condenar o réu a prestar contas, por ser de mérito, é recorrível por agravo de instrumento. (Grupo: Procedimentos Especiais). Ademais, contrapõe-se a seguir dois acórdãos do Tribunal de Justiça de São Paulo. Um foi proferido pela 13ª Câmara de Direito Privado no dia 22 de agosto de 2018 e outro pela 19ª Câmara de Direito Privado em 13 de julho de 2018 (ou seja, existe um interregno de um pouco mais que um mês entre as duas decisões).
[18]O Plenário do Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (TRT-18) firmou a tese jurídica vinculante no sentido de “salvo na hipótese de interposição de recurso pela União contra sentença homologatória de acordo, a interposição de recurso ordinário contra decisão proferida em sede de execução configura erro grosseiro, ante a ausência de dúvida objetiva sobre o recurso cabível nessa fase processual, não se aplicando, portanto, o princípio da fungibilidade recursal”. Esse entendimento foi tomado durante o julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 11, admitido em março de 2020. Essa tese é aplicável para os processos no âmbito do TRT-18 que estejam discutindo matéria idêntica. O processo piloto dizia respeito à possibilidade ou não de aplicação do princípio da fungibilidade para receber como agravo de petição o recurso ordinário interposto contra decisão proferida em sede de execução. O relator, desembargador Paulo Pimenta, ao apreciar o incidente, analisou o princípio da fungibilidade decorrente do princípio processual da instrumentalidade das formas muito utilizado pelo Direito Processual do Trabalho. Ele comparou a utilização desse princípio dentro do processo civil e trabalhista e a aplicabilidade nos processos desde que haja existência da boa-fé processual e inexista erro grosseiro. Processo: 0011052-06.2019.5.18.0000.
[19] Marinoni, Arenhart e Mitidiero consignam que o recurso adequado para decisão da primeira fase da ação de exigir contas é o agravo de instrumento, pois seu efeito suspensivo é ope judicis, isto é, depende da apreciação e concessão do respectivo tribunal de 2ª instância o que, segundo os autores, “permite dosar com maior prudência a necessidade de paralisar ou não a apresentação das contas enquanto se discute sobre o dever de prestá-las”
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