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Bruno da Silva Amorim - Articulista
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Gestor Público pela Universidade Federal de Pelotas, Especializando em Contabilidade Pública pela Universidade Estadual do Ceará e Acadêmico de Direito pela UCPel.

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Artigo do articulista

Contextualização histórica do voto feminino no Brasil sob um olhar democrático à sua obrigatoriedade

Contextualização histórica do voto feminino no Brasil sob um olhar democrático à sua obrigatoriedade

Autores: Bruno Amorim; Yasmim Monteiro Schafer; Victor Hugo Mouchet Silva Alfaya; Vitória Medeiros Dias.

Para discutirmos o voto obrigatório precisamos voltar no tempo, especificamente em 1523, ano que ocorreu o primeiro ato eleitoral do Brasil no estado de São Paulo, quando os moradores da vila da antiga colônia portuguesa foram às urnas eleger o Conselho Municipal.

Até 1821 o voto era aberto e os únicos que possuíam o direito ao sufrágio eram homens livres. O primeiro projeto de mudança no formato de votação foi elaborado em 1823, após o processo de independência do Brasil e pré-formulação da Carta Magna, conhecida como Constituição da Mandioca ou da elite agrária. O projeto permitiria a votação a quem possuísse mais de 150 alqueires de mandioca, excluindo assim, toda a parcela da população marginalizada para a época.

Em 1824, Dom Pedro I outorgou a Constituição, na qual ficou estabelecido o voto censitário e não secreto, e nesse mesmo período começaram os episódios de fraudes eleitorais: um caso explícito era o voto por procuração que transferia o direito individual ao voto para outra pessoa, já em 1842 esse formato foi proibido. Depois, através da Lei Saraiva de 1881, o título de eleitor sem foto é instituído, o fato da ausência de comprovação de identidade fotográfica permitia a continuidade das fraudes.

Assim, na Constituição Republicana de 1891 ocorreu o primeiro voto direto para Presidente e Vice-Presidente, sendo eleito Prudente de Moraes e tendo como seu vice Manuel Vitorino. Partindo desse ponto, o primeiro movimento sufragista feminino da história, ocorreu em 1893 na Nova Zelândia. A insatisfação das mulheres se deu ao encontrar a exclusão feminina em textos da filosofia, como documentos autorais de John Locke e Jean-Jacques Rousseau, assim elas encontraram campo para debater seus posicionamentos no campo iluminista das ideais democráticos.

Um dos focos principais para que começasse a ser questionado o motivo de as mulheres não terem os mesmos direitos à votação que os homens, foi quando perceberam que na época muitas delas estavam em postos importantes da sociedade, mas eram consideradas incapazes de assumir a responsabilidade de escolha do voto. Assim sendo, o direito ao voto feminino foi concebido em Mossoró – RN no ano de 1928, pelo na época atual governador Juvenal Lamartine. Nesse mesmo ano, uma expoente do movimento feminista da época, Julia Barbosa, enviou uma carta a outra relevante sufragista da época, Bertha Lutz (1928), que em um de seus trechos falava um pouco sobre a importância da emancipação feminina:

O feminismo educado e moralizado será a dinâmica das gerações novas. Hoje, vemos na pátria de Washington as mulheres exercendo funções públicas, jumas legislam na Câmara, outras são advogadas e uma chegou a governar um dos Estados daqueles singulares Estados Unidos. Vendo e percrustando a marcha do feminismo, não podemos deixar de encorajar as sertanejas, que aliam suas virtudes cívicas ao seu devotamento extremo e nobreza de sentimentos. Que a vitória seja o prêmio dos vossos esforços” (Julia Barbosa a Bertha Lutz, 1928).

No Brasil, Celine Guimarães em 1932 foi a primeira eleitora mulher do Município de Mossoró (RN). No momento foi promulgada a Lei n⁰ 660 que estabeleceu a não disposição de sexo para a votação. O sufrágio feminino é um movimento social político e econômico que promoveu a conquista de muitos direitos das mulheres.

É fato também que o direito ao voto feminino, em seus primórdios na experiência brasileira, teve uma caminhada difícil, pois na Constituinte de 1890, houve forte discussão sobre tal sufrágio, entretanto a emenda não foi aceita com a alegação de que se decretada a lei, haveria a dissolução da família brasileira e que a mulher não possuía a mesma capacidade que o homem perante o Estado. Ademais, até o ano de 1932, no qual foi promulgado o novo Código Eleitoral, esse direito em âmbito nacional não existia. Assim, com a inovação legislativa, foi concebido o seguinte texto, nos Artigos. 2º e 21 da Carta Eleitoral:

Art. 2º. É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código (…)Art. 121. Os homens maiores de sessenta anos e as mulheres de qualquer idade podem isentar-se de qualquer obrigação ou serviço de natureza eleitoral (BRASIL, 1932).

Ainda assim, tal direito não constava na Constituição Federal da República como um dos direitos regidos por tal Carta, o que veio a ocorrer dois anos após a situação relatada acima, em 1934.

Sabe-se que a trajetória da existência desse voto foi muito conturbada, pois a mulher ainda estava sob o manto do patriarcado, inclusive através de leis que a obstavam de ter capacidade civil plena, tendo sua participação em diversos setores condicionadas pela vontade do marido ou do pai. Isso se refletia na participação das mesmas no jogo político, povoado majoritariamente por homens, que não estavam tão interessados em conquistas femininas por representar um risco à sua dominância nas estruturas de poder vigentes.

É importante ressaltar que houve muitos momentos relevantes após a inserção da mulher no sistema político nacional: iniciando pela participação feminina na política, em 1934; seu enfraquecimento em suas bases de atuação de 1937 a 1945, com o período ditatorial e consequente readequação da mulher ao papel de pessoa obrigada a gerir a manutenção do lar; a reinserção da mesma após o fim da 2ª Guerra Mundial e o período de redemocratização; até a ebulição do Feminismo na América em 1960 e a promulgação do Estatuto da Mulher Casada, em 1962, no qual a mulher deixou de ser representada legalmente pelo homem e passou à figura de colaboradora do chefe de família.

A partir daí, na fase mais moderna da inserção feminina na política, já começa a ser plenamente capaz de direitos e deveres na ordem constitucional, sendo possível identificar que as mulheres representaram maioria entre os eleitores e em geral tendem a ter posicionamentos diferentes dos homens votantes, tornando o sufrágio de extrema importância visto que são um grupo decisivo na disputa do pleito eleitoral. Assim, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na última eleição presidencial – 2022 – elas representaram 53% dos votantes contra 47% do sexo masculino.

Com a constituição de 1988, houve um avanço significativo na garantia da cidadania para as mulheres, ganhando mais espaço em seus posicionamentos, consequentemente, suas organizações tomam destaque em massa nos espaços não-governamentais. A inserção feminina nos espaços políticos ainda é um foco de luta, ao passo que o cenário político é composto ainda majoritariamente por figuras masculinas, o que faz relembrarmos os motivos pelos quais as mulheres não votavam. Por esses motivos, a inserção do voto obrigatório se faz necessária à luta das repressões e preconceitos, historicamente estruturados na sociedade brasileira, bem como, de uma maior inserção da mulher na pesquisa e estudo das relações políticas nacionais.

Ao longo da história do Brasil, diversos pensamentos conservadores e machistas assombraram a política feminista no país, e muitas vezes, vindo de representantes da própria população. Em tom poético, o deputado Serzedelo Correa (PA) uma vez afirmou que:

A mulher, pela delicadeza dos afetos, pela sublimidade dos sentimentos e pela superioridade do amor, é destinada a ser o anjo tutelar da família, a educadora do coração e o apoio moral mais sólido do próprio homem. Jogá-la no meio das paixões e das lutas políticas é tirar-lhe essa santidade que é a sua força, essa delicadeza que é a sua graça, esse recato que é o seu segredo. É destruir, é desorganizar a família. A questão é de estabilidade social (Serzedelo Correa).

Mesmo que não explicitamente, esse pensamento ainda está enraizado na atual esfera política brasileira e contribui negativamente para que a mulher tenha um papel inferior ao homem nas disputas eleitorais e na ocupação de espaços de poder que deveriam ser iguais a ambos os sexos. Por esses motivos, o voto obrigatório não deve ser considerado como um inimigo, mas sim, como uma oportunidade de mudança nesse cenário que impede a imersão das mulheres na tomada de decisão política no Brasil.

Atualmente, o Brasil está no ranking mundial na 142ª posição em representação feminina na política. Existe grandes movimentos que tentam mudar esse cenário, e uma das alternativas adotadas foi a determinação de que cada partido preencha no mínimo 30% e máximo 70% de cada sexo nas candidaturas. Infelizmente essas alternativas não são efetivas, e isso é notório nos cargos de maior importância do Senado Federal.

Estima-se que na última eleição para presidência da República a ex-candidata Simone Tebet tenha tido 88% de seus votos vindo de mulheres. Essa realidade a deixou em 3º lugar na disputa, por isso, haver representantes femininas em cargos públicos incentiva que um número maior de mulheres se sintam representadas, e exerçam seu dever de forma democrática.

A partir da contextualização histórica e avanços do direito ao voto no cenário brasileiro, abordados nesse artigo, é possível afirmar que é intrínseco neste direito, o dever de ação cívica em participar das decisões políticas do país. A participação popular, primordialmente de mulheres, é um dos principais caminhos para a conscientização das novas gerações de eleitoras à reprimirem preceitos limitadores e preconceituosos dentro da política, onde o voto obrigatório se faz presente para facilitar esse objetivo.

É primordial pensar em um futuro, onde a população consiga mudar o cenário do pensamento repressor estrutural, a fim de possibilitar que novas expoentes consigam adentrar ao cenário político nacional. O poder de votar, que por muito tempo foi considerado uma virtude à poucos, hoje é uma conquista que merece ser exercida e cultivada.

Referências

BONDOLFI, Sibilla. Mulheres na Suíça lutaram muito tempo pelo direito de voto. 2017. Disponível em: < https://www.swissinfo.ch/por/dia-internacional-damulher_mulheres-na-su%C3%AD%C3%A7a-lutaram-muito-tempo-pelo-direitode-voto/42993224 >. Acesso em: 10 de nov. 2022.

Carta de Julia Barbosa para Bertha Lutz. Arquivo Nacional. FBPF, BR RJANRIO Q0.ADM, COR.A928.107. Natal, 23 de janeiro de 1928.

Câmara dos Deputados. AS SUFRAGISTAS: A LUTA PELO VOTO FEMININO. 2021. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/internet/agencia/infograficos-html5/a-conquista-dovoto-feminino/analise.html >. Acesso em 10 de nov. 2022.

MACHADO COELHO, Leila. A história da inserção política da mulher no Brasil: uma trajetória do espaço privado ao público. 2009. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519549X2009000100006 >. Acesso em 10 de nov. 2022.

PASSARINHO, Natália. 3 fatores que explicam por que mulheres serão decisivas na eleição de 2022. 2022. Disponível em: <https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2022/05/30/interna_politica,1369880/3-fatores-que-explicam-por-que-mulheres-serao-decisivas-na-eleicao-de2022.shtml >. Acesso em: 10 de nov. 2022.

Redação RBA. Dilma: ‘Conquistamos o voto, mas precisamos avançar sobre o direito de ser votada’. 2022. Disponível em: < https://www.redebrasilatual.com.br/politica/dilma-conquistamos-voto-direito-deser-votada/ >. Acesso em: 1º de dez. 2022.

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WESTIN, Ricardo. Para críticos do voto feminino, mulher não tinha intelecto e deveria ficar restrita ao lar. 2022. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/arquivo-s/para-criticos-do-votofeminino-mulher-nao-tinha-intelecto-e-deveria-ficar-restrita-ao-lar >. Acesso em: 10 de nov. 2022.

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