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“Amarildo, Amarildo, Amarildo, Amarildo…”, gritava de forma efusiva o narrador Geraldo José de Almeida, da Rádio Record. Amarildo, jogador do Botafogo, foi o escolhido pelo técnico Aymoré Moreira para a dura e praticamente impossível missão de substituir o Rei Pelé, que se machucou no segundo jogo da Copa de 1962. A contusão foi o drama do mundial. Na partida seguinte, contra a Espanha, o “Possesso”, como o chamou Nelson Rodrigues, marcou os gols que garantiram a classificação da seleção para as quartas de final. Foi um sufoco, mas a equipe nacional estava viva na disputa pelo título.
Ninguém imaginava que o caminho do Brasil em campos chilenos seria tão acidentado. A seleção canarinho nunca tinha chegado a um mundial com tanta confi ança. E não era para menos! Depois de assombrar o mundo em 1958, os craques, praticamente os mesmos, estavam prontos para repetir a façanha da Itália, que em 1934 e 1938 conquistou o bicampeonato. Entretanto, a Copa é assim: não existe facilidade.
Desde que comecei a pesquisar sobre a história dos mundiais, aos 13 anos, o que me chamava atenção na Copa de 1962 era o formato da trave do Estádio Sausalito, em Viña del Mar, e também do Nacional, em Santiago: um arco segurava a rede. Parecia futebol de botão! Outra cena inesquecível foi quando um cachorro invadiu o campo e driblou nada mais nada menos do que Garrincha, no jogo contra a Inglaterra! Talvez tenha sido o único drible sofrido por Mané em toda carreira.
Quando se diz que Garrincha jogou por ele e por Pelé em 1962, não é nenhum exagero. O ponta que assombrou o mundo em 1958 foi melhor ainda quatro anos depois: fez gol de cabeça e até com o pé esquerdo. Um destaque negativo foi quando Mané acabou expulso de campo contra o Chile, na semifi nal. Como não havia cartões amarelo e vermelho, Garrincha seria julgado por um tribunal da FIFA que decidiria se ele poderia ou não jogar na partida seguinte, simplesmente a decisão da Copa. Paulo Machado de Carvalho, o “Marechal da Vitória”, mexeu os pauzinhos e fez o bandeirinha uruguaio, Esteban Marino, desaparecer de Santiago e não relatar o que Mané tinha feito contra um adversário. Aquela artimanha o garantiu na fi nalíssima. O incidente envolveu até o então primeiro-ministro Tancredo Neves, pois o sistema político do Brasil era o parlamentarismo.
Nas pesquisas para este livro, os jornais da época desmentem a versão de que Vicente Feola, técnico campeão de 1958, não comandou a seleção brasileira em 1962 porque fi- cou doente. Não foi bem assim. No fi m de 1960, o técnico aceitou um convite para treinar o Boca Juniors, da Argentina, e deixou a equipe nacional. Para seu lugar, veio Aymoré Moreira. No entanto, Feola rompeu o contrato com o clube argentino depois de oito meses e voltou à seleção como coordenador técnico. Ele fi cou doente durante a fase preparatória, já em 1962, e os médicos o proibiram de viajar com o grupo. De qualquer forma, Vicente Feola não seria o comandante do escrete nacional.
Assim como em 1958, a população brasileira acompanhou os jogos da Copa ao vivo pelo rádio. Mas, ao contrário dos mundiais anteriores, havia uma novidade: o videoteipe. A torcida poderia assistir às partidas com um ou dois dias de atraso, confortavelmente na sala de casa. Felizmente, dos seis jogos do Brasil na Copa, cinco foram preservados na íntegra.
Dos onze jogadores que estavam na final de 1958, oito enfrentaram a Tchecoslováquia naquele inesquecível dia 17 de junho de 1962. A vitória, de virada, por 3 a 1, confir- mou a hegemonia do futebol brasileiro. Uma campanha histórica e invicta que completa sessenta anos.
Viva aos bicampeões!
Thiago Uberreich/junho de 2022.